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quinta-feira, 25 de março de 2010

Mira Clock - O Carnaval em Angola

A Mira Clock é uma "levartiana" que assume o voluntariado e a entrega ao próximo como uma forma de vida. Uma mulher de olhar doce e angelical que busca na arte a expansão da sua alma. Dessa forma, exprime-se livremente em textos onde as suas dúvidas e inquietações transformam-se em reflexões dárias escritas em jeito de crónicas.

Reflexões de Mira Clock:


Ah! O carnaval!... como é bom viajar em minhas memórias e reviver a minha infância: as bodas de carnaval no bairro da avó, os quimones e as saias de pano provenientes do Congo, os rapazes mascarados de senhoras com vestidos e perucas, as pinturas exageradas, as roupas rasgadas e outras fantasias improvisadas; surpreendente, ainda, era o entusiasmo que nos caracterizava enquanto fazíamos os colares de missangas, de rebuçados ou pipocas, para desfilarmos pelas ruas ao ritmo dançante das diferentes coreografias por nós desenhadas e arquitectadas. E todo este festejo de rua culminava na emoção de assistir pela televisão os desfiles dos grupos carnavalescos na marginal movidos pela curiosidade de tentar imitar o cabetula ou a varina, mesmo sem grande êxito; No desatar da alegria, o carnaval era uma festa do povo onde a folia era sentida por todo lado: nos brilhos, nas gargalhadas por detrás das máscaras e nas lantejoulas que conferiam um brilho fascinante ao carnaval daquela época …
Mas com o passar dos anos, a imperiosa mão do tempo, começou a pesar em mim e para trás ficou a minha infância; ficou também a folia, ou seja, de carnaval em carnaval, eu comecei a sentir menos a magia das cores e da música, gerada por esta festa do povo; perante esta realidade questionei-me: o que terá sucedido? e quase imediatamente e, a priori, pensei: “bom se calhar eu apenas cresci e me desinteressei, por isso, deixei de prestar a atenção”; mas pouco convencida servi-me das faculdades da observação e da análise: “eu cresci! Mas continuam a existir crianças! Então, porquê que já não vejo as crianças todas mascaradas e felizes como antes? E os adultos?! Porquê que os vejo indiferentes a este facto! O que se passa afinal? E neste meu pequeno diálogo interno consegui ao menos chegar a uma triste conclusão : “em muitas mentes a ideia de festejar o nosso carnaval está a morrer, arrastando a passos largos a nossa cultura para o cemitério do esquecimento; mas sabem mesmo o que mais me chocou? Foi, e digo com a frontalidade de quem sabe assumir os seu erros, perceber que eu fazia parte desta escumalha; reconheci-me igual a tantos outros que com a excepção das badaladas festas de carnaval nas discotecas da moda, nos grande salões e das fantasias fashion das boutiques, estão-se literalmente nas tintas para a cultura do carnaval; no fundo para o nosso povo e para as nossas crianças;
Perante este meu acto de contrição, e esta desilusão para com a minha conduta pensei com alívio que a esperança é a última a morrer! E de esta minha reflexão pessoal surgiu este artigo que tem a intenção de tentar resgatar em algumas mentes angolanas o interesse digno de uma cultura que nos pertence.
Imaginem só! O que seria do carnaval se aquelas pessoas que lutam para mantê-lo vivo desistissem de lutar? Imaginem!!! O que seria se já não houvessem desfiles na marginal, nem pessoas nas ruas mascaradas?… talvez não houvesse grandes mudanças na nossa vida diária, mas o que seria da nossa cultura? Será que um povo sobrevive sem cultura? Sem aquelas características que o identificam? Acredito que até se pode sobreviver mas seria como se vivesse só por viver! Desprovidos de uma origem, de um passado, de uma identidade…e na minha humilde opinião, a cultura de um povo é a sua alma, o seu suporte, logo, deve ser preservada e respeitada; assim, não poderia deixar este meu artigo sem algumas soluções benéficas para o carnaval; vamos todos dança-lo sem quijila; vamos passar o testemunho aos nossos filhos e aos nossos irmãos; vamos aplaudir e lisonjear os grupos carnavalescos; vamos criar iniciativas diversas para salvaguardar a nossa tradição, pois é por ela que sabemos quem somos e de onde viemos… mas mais importante, para onde queremos ir! Como tal, que não haja uma leve hesitação no desejo de enaltecer o nosso orgulho de sermos angolanos, gritemos todos bem alto, VIVA A CULTURA, VIVA O CARNAVAL, VIVA ANGOLA…. Obrigada!




LEV’ ARTE
MIRA CLOCK
Fevereiro De 2010

Um comentário:

Mauro Yange disse...

Cara Mira, permita-me dizer que o actual desinteresse pelo Carnaval em Angola é apenas a ponta do Iceberg. O problema é bem maior do que pensamos, pondo a parte o Carnaval, já reparou nas novas "brincadeiras" da meninada de hoje? Playstation, computador, Internet... Estamos perante de uma "crise" global de sedentarismo.