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sexta-feira, 27 de março de 2009

Kimbanda

Kimbanda

Olhou para o rio revolto enquanto as aves esvoaçam por entre os juncais das lundas. Consegue sentir o calor da terra vermelha nos seus pés descalços. O pano que lhe envolve o corpo não impede a passagem do calor...a necessidade de sombra leva-a a proteger-se numa clareira de mangais. No ar os relâmpagos anunciam a vinda de uma tempestade. As kissondes agitam-se para o interior das suas construções de barro e areia...é fabuloso ver estes morros numa paisagem livre de edificações...equivalem, no reino das térmitas a edifícios da altura das torres gémeas mas completamente percorridos por galerias que se perdem por túneis subterrâneos que ligam as diferentes termiteiras. Perde-se a espreitar por entre as galerias das termiteiras enquanto observa o movimento acelerado das kissondes que transportam...folhas, troncos, etc...alguns maiores do que elas.
O vento ruge com força levantando a poeira e folhas no ar. É visível ao longe na clareira os remoinhos de vento que sugam para o seu interior todos os objectos voadores....não arrisca ir até ao seu velho ">range rover que deixou estacionado a pelo menos um kilómetro dali. Deixa-se estar protegida no mangal...as gotas de chuva molham-lhe o pano vermelho com motivos africanos. Despe o pano e estende-o no chão onde se deita. Deixa-se estar a observar o céu e a chuva que cai. A sensação de liberdade é total. As trovoadas retiram-lhe qualquer sensação de protecção...mas não consegue ter medo. Não receia...sente-se viva. Sente-se aquela criança que adorava apanhar mangas à chuva em Calonda...apesar da chuva, o calor é imenso. Fecha os olhos para conseguir sentir o toque das gotas de chuva no corpo. Consegue por entre a chuva intensa aperceber-se do movimento lento de algumas gotas que lhe percorrem o pescoço vindas do cabelo. Concentra-se nesse deslizar enquanto a sua mente viaja para os beijos na nuca dados pelo seu Leão Magno. Sente um arrepio na coluna...é difícil conter a excitação. O frio na barriga não a deixa mentir-se a si própria. Ela ainda ama aquele homem. Enrola-se no pano e chora: quando é que eu vou esquecer este Leão Magno? Até que sente uma mão forte no seu braço.
- Moça tás mal? Grita-lhe aflito para ver aquele corpo inerte no chão levantar-se num ápice. enquanto prende o pano ao pescoço.
-Tava tudo bem até agora, ruge, enquanto olha para o homem completamente molhado que tem à sua frente.
-Pareceu-me que estavas mal?
-Não! Só estava a descansar debaixo desta tempestade...e até estava a gostar.
-Ah...ok. Eu vou andando então...estava aqui a pescar, mas já percebi que hoje não é um bom dia para a pesca. Vou andando para casa...E você? Fica por aqui à chuva?
-Sim...
-Então fica bem...mas se quiseres dou-te boleia até ao teu jeep. Vi um carro estacionado na beira da estrada e ainda é bem longe para ires daqui. O meu nome é Wayami...e o teu?
- O meu é Lueji.
-Como a rainha?
-Sim...sou uma das suas descendentes...
-oh...que curioso...eu sou descendente do rei tchimbinda...
-Sério? Sabes que eles casaram?
-Sei, sim...
-E por acaso o encontro deles foi muito semelhante a este...ele estava a caçar e ela em lazer.
-Adoro este tipo de coincidências. Fazem-me crer que estou no caminho certo. Penso que são mensagens dos meus protectores.
-Protectores?
-Sim. Eu sou kyoka amigo...acredito no sobrenatural!
-Eu sou baluba...e acredito no natural...diz a rir-se. Oh rainha, ajuda-me a levar o material da pesca...até ao carro. E eu compenso-te com uma boleia...sei que os kyokas são orgulhosas. Não gostam de pedir favores...
-É a primeira vez que me dizem isso...tinha de vir de um tchimbinda(burro)...

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